Resolução BCB 80/21: Novidades para as IPs

Por Luciano Fantin

No dia 25/3/21, o Banco Central do Brasil (BCB) trouxe uma mudança regulatória importante, com a publicação da Resolução BCB 80, que entrará em vigor em 03/05/21, revogando diversas regulamentações, dentre elas a Circular 3885/18, que tem sido o cerne regulatório dos serviços de pagamento, em observância à Lei 12.865/13.

Seguem algumas alterações relevantes que pudemos observar, para as quais tecemos nossos comentários:

  1. O artigo 4 dispõe sobre as vedações aplicáveis às instituições de pagamento (IP) na prestação de serviço de iniciação de transação de pagamento. Foi criada uma nova vedação, no inciso V: “iniciar transação de pagamento envolvendo conta de pagamento mantida por instituição não integrante do Sistema de Pagamentos Brasileiro”.

A intenção aqui parece ser a de limitar o espectro de instituições que poderão se valer da IP operando da modalidade “iniciador de transação de pagamento” (ITP). Somente instituições participantes do SPB (incluindo aí aquelas integrantes do Sistema de Pagamentos Instantâneos – SPI, por conta do Pix, mesmo que de forma indireta), poderão ser “conectadas” pelo ITP.

  1. O processo de autorização foi extirpado de uma norma única, visto que a Circ. 3885/18 possuía 3 anexos:
    • Anexo I: Regulamento do Plano de Negócios
    • Anexo II: Relação de documentos e informações necessários à instrução do processo
    • Anexo III: Regras para autorização de funcionamento do ITP

As referidas regras foram agora transpostas e incorporadas em regulamentação específica, a Resolução BCB 81 de 25/03/21, que disciplina os processos de autorização relacionados ao funcionamento das instituições de pagamento e à prestação de serviços de pagamento por parte de outras instituições autorizadas a funcionar pelo BCB.

Em seu artigo 4, o BCB informa que divulgará os procedimentos, os documentos e as informações exigidos nos processos de autorização.

  1. O artigo 5 trouxe importantes novidades:
    • O parágrafo1 apresenta a vedação de constituição de IP como sociedade empresária na qual figure sócio único.
    • O parágrafo 3 determina que as sociedades limitadas devem prever em contrato social a observância supletiva da Lei 6404/76, inclusive no que diz respeito à retenção de lucros e à constituição, reversão e utilização de reservas.
    • Os parágrafos 4 a 6 trazem a obrigatoriedade da utilização da expressão “Instituição de Pagamento” na denominação social, a comunicação clara dessa condição aos clientes e usuários e a divulgação das modalidades de prestação de serviços de pagamento. Aquelas IPs já autorizadas deverão cumprir essas exigências até 31/12/2022.

Nos parece aqui clara a intenção de prover às IPs uma maior robustez legal-societária, bem como demandar padronização e comunicação adequadas aos clientes e público em geral, sobre a modalidade de serviços de pagamento que são prestados pela instituição.

  1. O artigo 6 determina que as IPs devem implantar política de governança, visando assegurar o cumprimento da regulamentação, sendo inclusive adequadamente documentada e submetida a revisões a cada dois anos. Ocorre que a exigência da existência de uma Política de Governança já está explicitada na Circular 3681/13, ali, contudo, com previsão de reavaliação anual:
    • A Circ. 3681/13, que trata de gerenciamento de riscos, patrimônio e governança de IPs já prevê, em seu artigo 8 que as IPs devem observar política de governança, aprovada pela diretoria executiva e pelo conselho de administração, quando houver, que aborde os aspectos relativos ao gerenciamento de riscos, gestão de patrimônio e, caso se aplique, à preservação do valor e da liquidez das moedas eletrônicas emitidas. A política deve: I – ser adequadamente documentada e submetida a revisões anuais, com a documentação mantida à disposição do Banco Central do Brasil; II – definir atribuições e responsabilidades; e III – garantir a independência das atividades de gerenciamento de riscos, inclusive mediante segregação entre a área operacional e a de gestão de risco.

Em nosso entendimento, a exigência da Política de Governança é muito relevante e bem-vinda, mas parece agora haver duas regulamentações sobre o mesmo tema, o que pode gerar certa confusão, uma vez que o artigo 8 da Circular 3681/13 não foi revogado pela Resolução BCB 80/21.

  1. O artigo 7 traz exigências relativas ao conteúdo do contrato social das sociedades limitadas, como prazo determinado do mandato do administrador, não superior a quatro anos admitida a recondução, quantidade mínima de três administradores, bem como a vedação da utilização do termo “diretor” a quem não pertencer ao estatuto ou contrato social da IP (se S.A. ou Ltda. respectivamente).

 

As novas determinações são bem-vindas, em termos de governança, uma vez que a gestão de uma IP deve contar com as necessárias segregações funcionais, evitando-se conflitos de interesse. A questão da nomenclatura de “diretor” é uma harmonização à prática já de muito tempo existente em instituições financeiras.

  1. O artigo 10 antecipou para 31/03/23 a necessidade de pedido de autorização do emissor de moeda eletrônica (antes, até 30/06/23) caso a volumetria não seja atingida até 31/12/22, conforme regra de transição, sendo nesse caso R$ 300 milhões em transações de pagamento ou R$ 30 milhões mantidos em contas de pagamento pré-pagas.
  1. O artigo 12 trouxe uma modificação no que tange ao que chamamos de “efeito cascata do pedido de autorização de uma modalidade”. A IP que solicitar autorização para funcionamento em uma das quatro modalidades previstas, deverá incluir, em sua solicitação, todas as modalidades em que já atua, independentemente da volumetria.

Os artigos 7 e 7-A da Circular 3885/18 se referiam ao ITP frente às demais modalidades, mas isso agora foi generalizado, o que simplificou a conceito.

  1. O artigo 16, inciso II, determina que os bancos múltiplos com carteira de crédito, financiamento e investimento e as sociedades de crédito, financiamento e investimento estão dispensados de autorização do BCB, para a prestação de serviços de pagamento, exceto os de credenciamento. Anteriormente, conforme artigo 34, inciso III, da Circular 3885/18, a dispensa valia para serviços de emissão de instrumento pós-pago e da modalidade de ITP.
  1. O artigo 16, inciso III, determina que as cooperativas singulares de crédito estão dispensadas de autorização do BCB, para a prestação de todas as quatro modalidades de serviços de pagamento. Anteriormente, conforme artigo 34, inciso III, da Circular 3885/18, essa dispensa de autorização não valia para os serviços de credenciamento.
  1. O artigo 16, inciso VII, traz agora a inovação de dispensa de autorização, por parte do BCB, para emissão de moeda eletrônica, por parte das sociedades distribuidoras de títulos e valores mobiliários e das sociedades corretoras de títulos e valores mobiliários.
  1. O mesmo artigo 16, §1, determina também, como novidade, que as instituições autorizadas a funcionar pelo BCB devem comunicar à referida autarquia, com noventa dias de antecedência, sua intenção de iniciar a prestação de serviço em modalidade dispensada de autorização.
  1. O artigo 21 inova, ao criar uma regra de transição para integralização de capital das “outras instituições autorizadas a funcionar pelo BCB”. Pela regra anterior, contemplada na Circular 3885/18, em seu artigo 41, e que foi mantida pela Resolução 80/21, em seu artigo 20, as outras instituições autorizadas devem integralizar o capital exigido para a prestação de serviços de pagamento, de acordo com as diferentes modalidades, adicionalmente ao que lhes é determinado, de acordo com sua natureza. A inovação do artigo 21 é possibilitar um cronograma de adequação conforme segue:
    • R$ 1 milhão para cada modalidade, a partir de 01/06/21;
    • R$ 1,5 milhão, para cada modalidade, a partir de 01/06/22 e
    • R$ 2 milhões para cada modalidade, a partir de 01/06/23
  1. Com a revogação dos artigos 12 e 13 da Circular 3681/13, o respectivo conteúdo normativo relativo à aplicação dos recursos mantidos em contas de pagamento foi transportado para a Resolução BCB 80/21, em seus artigos 22 e 23.
  1. Em relação à necessidade de observância das IPs de determinadas normas específicas, constantes do artigo 18 da Circular 3681/13, ora revogado, chamou-nos a atenção o seguinte:
    • O artigo 25 manteve a necessidade de observância da Resolução CMN 3694/09 (“suitability”), Resolução CMN 3919/10 (tarifas) e Resolução CMN 2554/98 (controles internos), tendo, porém, retirado menção à Circular 3289/05, que dispõe sobre a constituição e a implementação, no Banco Central do Brasil, do Sistema de Registro de Denúncias, Reclamações e Pedidos de Informações (RDR). Isso porque, a Circular 3729/14 que revogou a referida Circular 3289/05, e passou a estabelecer explicitamente, em seu artigo 2, a obrigatoriedade de atendimento ao RDR por parte de IPs.
    • Uma questão menor, mas importante para o mercado, é que o BCB resolveu deixar de mencionar a capitulação das normas a que se refere, adotando apenas o nome do “assunto”. Seria importante que houvesse sempre a indicação da natureza e do número do normativo.

Luciano Fantin

28/03/21

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